O cinismo
Não aprecio o cinismo, excepto nalguns escritores especialmente dotados, ou então, no quotidiano, como exercício de estilo para espantar os chatos. Mas o cinismo, em mim, é uma reacção pouco natural. Usei algumas vezes o sarcasmo, mas acho que fui cínico pela primeira vez aos 20 anos, num fim de tarde de que nunca me esqueço (em que ouvi uma frase inédita: «não sejas cínico»). Depois disso, tenho evitado sempre o cinismo, que é muito atraente mas muito pouco sadio. No entanto, não consigo evitar ser cínico quando vejo acontecerem coisas (negativas) previsíveis. Coisas que eu sabia que iam acontecer exactamente assim. Nessas casos, sou cínico, cínico para mim mesmo, como quem diz a si próprio: «eu não te dizia?»