O cão branco
Só vi uma vez, e na televisão, um dos menos conhecidos e mais caluniados filmes de Samuel Fuller, o «racista» White Dog (1982), a história de um pastor alemão branco que foi treinado para atacar pretos. Só uma leitura desonesta (influenciada pela fama de Fuller como «reaccionário», que se baseia sobretudo num filme anticomunista, aliás excelente) é que não percebe que Fuller denuncia e investiga o condicionamento que preside ao racismo, não nos cães mas nas pessoas.
O que eu não sabia é que o filme é adaptado do livro de memórias homónimo (1968) do romancista francês Romain Gary, que foi casado com a actriz Jean Seberg. O cão do título pertencia ao casal, quando eles viveram em Los Angeles. A certa altura, eles descobrem que o cão foi programado desde pequenino a reagir violentamente a negros. Coisa especialmente problemática visto que Seberg era activista dos Black Panthers. O cão teve que ser abatido, e Gary conta a história quer como retrato dos Estados Unidos quer como mais um elemento de tragédia na vida deste casal infeliz (tanto um como outro se suicidaram). Considerado demasiado polémico, White Dog nunca estreou comercialmente nos Estados Unidos.