13.11.06

O maluco que ria



Quando Syd Barrett morreu, há uns meses, tive curiosidade em ouvir o seu álbum a solo de 1970, The Madcap Laughs, que ele gravou depois de ter sido despedido dos Pink Floyd. Desembrulhei o CD, que tinha comprado mas que nunca tinha tocado, e fiquei surpreendido. The Madcap Laughs não é exactamente um álbum: são demos, às vezes mal cantadas, com conversa de estúdio e algumas melodias simples e acompanhamentos amadorísticos. As letras, embora contenham um poema de Joyce e a reveladora «Dark Globe» (em que Barrett relata a sua esquizofrenia) não fazem nenhum sentido (dois exemplos: «close our eyes to the octopus ride» ou, ainda melhor, «yum, yummy, yum, don't, yummy, yum, yom, yom»). Eu contava com um álbum chanfrado e psicadélico e deprimente. E enfim, é um bocado psicadélico (mas sobretudo pastoral) e um bocado chanfrado (mas sobretudo ingénuo). O que não é nada é deprimente. Parece um Nick Drake num dia em que tomou a medicação. Os temas andam bastante à volta de raparigas (há, no interior do disco, uma moça fotografada de rabo nu atrás de um Syd janado e despenteado) e às vezes são alegres e um bocadinho melancólicos como os dos Kinks. A chave destas gravações está porventura em «No Man’s Land», na qual que não se percebe quase nada dos últimos versos, murmurados por Barrett, que achou muito bem que a canção ficasse assim mesmo. Eu aliás confesso que comprei o disco mais por razões de conhecimento histórico do que de interesse musical. E, naturalmente, porque tenho grande empatia com malucos que riem.