«O Perfume»
Nunca li O Perfume (1985), de Patrick Suskind, porque sempre o ouvi altamente elogiado por gente que lê pouquíssimo ou só lê merdices. E confesso que suspeito bastante de romances que vendem 15 milhões de exemplares. Acredito que o livro seja potável (sei que houve críticas decentes de críticos respeitáveis, que Kubrick e Scorsese quiseram adaptar a coisa, que Cobain escreveu «Scentless Aprentice» baseado na história). A julgar pela versão fílmica, que vi agora, O Perfume parece um romance histórico de matriz gótica e propensão para a fábula. Detectei dois temas relevantes: uma análise detalhada do mais indescritível dos cinco sentidos (que talvez resulte no livro, mas na tela é apenas representado por 27 narizes) e uma meditação sobre a insensibilidade ética do esteta radical. O filme é um europudim grotesco, previsível e preguiçoso, cheio de dinheiro mas sem nenhum talento, com um herói viciado em virgens cheirosas («Noseferatu», chamou-lhe o escritor Peter Ackroyd) que mata para lhes guardar o cheiro, o qual tem um efeito muitíssimo poderoso sobre as multidões. Munido dessa essência, uma espécie de «killing joke» da harmonia sexual, a narrativa descamba numa instalação de Spencer Tunick, com toda a gente descascada a fornicar numa praça onde estava instalado o cadafalso do assassino. Resumindo: gosto pelo «tabu» e pozinhos «new age». Fiquei com a certeza de que nunca lerei tal romance. Nem que com que isso perca 300 oportunidades de conversa com as muitas miúdas cheirosas e tontinhas deste mundo.