25.11.07

O provedor dos leitores

É evidente que o «provedor dos leitores» de um jornal deve ser crítico, sempre que encontre erros de facto, infracções deontológicas, descuidos, abusos, etc. O provedor cessante do Público esteve bem quando apontou esses desvios, nomeadamente os casos de copy paste via Wikipedia ou media estrangeiros. Mas um provedor dos leitores não é uma arma de arremesso contra os jornalistas. E Rui Araújo foi manifestamente isso durante o seu mandato. O conteúdo dos seus textos estava genericamente correcto; o tom dos seus textos era muitas vezes insuportável. O sarcasmo constante fica mal a um provedor que se queira dar ao respeito. Rui Araújo não escondeu o desprezo que nutria pelos jornalistas do «seu» jornal. Via-se nas constantes generalizações, apartes desnecessários e pelo menos uma grosseria. Vestindo a enfadonha toga do jornalista da «velha guarda», dava a entender que os jornalistas de agora são analfabetos, levianos, pouco éticos. Nos anos que passei no Diário de Notícias, conheci dois ou três exemplares desses auto-proclamados Jornalistas Éticos. A sua arrogância «cultural» não tem limites. E os seus telhados de vidro são de vidro finíssimo. Pensem na intervenção de Rui Araújo na polémica sobre as acusações de plágio a Miguel Sousa Tavares: ainda que ele pudesse ter razão em termos substantivos (e acho que não tinha), não estava manifestamente em condições imparciais para se pronunciar (é amigo próximo de MST, como aliás se notou). Que diabo, até os juízes, que são titulares de órgãos de soberania, pedem escusa quando se sentem incapazes de imparcialidade. Não defendo que o provedor seja inócuo, porque para ser inócuo mais vale não exisitir. Mas o provedor exerce a sua função em favor dos leitores, e não contra os jornalistas. Um provedor não se deve refugiar nas grandes questões teóricas, nem passar a vida a questionar pontos e vírgulas. Creio que Mário Mesquita foi quem melhor cumpriu o cargo até hoje, em parte porque nele confluíam doses exactas de teoria e prática (embora, por exemplo, num plano mais conceptual, Diogo Pires Aurélio tenha produzido bons textos). Joaquim Vieira parece-me uma boa escolha para o Público. O que se lhe pede é que, tal como fez Rui Araújo, critique, questione, discorde, sempre que for caso disso. O que se lhe pede é que, ao contrário de Rui Araújo, não trate os jornalistas como se fossem garotos.