2007
A figura do ano, por razões políticas óbvias, seria sempre Sarkozy. E agora a figura do ano é ainda mais Sarkozy, por razões estéticas ainda mais óbvias. Respect. No mais, 2007 foi um ano merdoso ou banal. O governo confirmou os tiques autoritários e acaba tomando de assalto o maior banco privado português. Cavaco, depois das «promulgações discordantes» dos primeiros tempos, esteve geralmente bem. O aborto foi despenalizado, marcando o princípio do fim do catolicismo em Portugal e o rebuçado anual que a esquerda terá (em pequenas doses) até 2009. A ASAE fechou a Ginginha e a IGAC fechou o Quarteto. O caso Maddie deixou mal os nossos polícias e os jornais ingleses. Falou-se muito em «pais biológicos» e na OTA. A TLEBS foi com os porcos, mas com o Acordo Ortogáfico as consoantes mudas vão à vida, por razões que nem o Agualusa me conseguiu explicar. O Tiepolo ficou cá, e a coleccção de discos de fado também. A exposição Amadeo foi um sucesso insólito. Chegou às bancas a Time Out Lisboa e abriu a livraria-com-livreiros Pó dos Livros. Os DVD da Midas são uma verdadeira cinemateca ao domicílio. O ano foi excepcional para dois moços talentosos, o Ricardo e o Ronaldo. Mas a «classe dirigente» caiu na sarjeta (Berardo, Marinho, Menezes). Tentaram vender-nos a mesma coisa com um nome diferente («Tratado» em vez de «Constituição»), explicando que temos que avançar sem fazer perguntas porque este assunto é «demasiado complicado» para as nossas almas simples. No «estrangeiro», todos os lamaçais do mundo estão piores do que estavam antes, começando pelo Médio Oriente, esse dominó de desgraças. Ratzinger tem convencido os cépticos (como eu) e alguns agnósticos e desiludido os ultras. Convivemos o ano todo com gente que não presta (Ahmadinejad, Chavez, Putin, Castro, Khadafi, Mugabe). Houve alguns mortos célebres (Benazir Bhutto, Ieltsin), algumas despedidas por exaustão (o estratega Karl Rove, o convertido Tony Blair e graças graças graças a Deus o escroque Chirac). Doris Lessing ganhou o Nobel. Amy Winehouse e Lindsey Lohan portaram-se outra vez mal. Owen Wilson portou-se tão mal que quase morreu. Anna Nicole Smith morreu mesmo. Em compensação, Al Gore subiu aos altares ainda em vida. Angelina Jolie continua com uma furiosa paixão pela adopção. Os Radiohead fizeram um manguito à indústria discográfica. Os reis estiveram consoante. O de Espanha teve um grito de alma magnífico. A de Inglaterra chegou aos 80 anos com uma dignidade de que nunca serão capazes as princesas tablóides. O da Bélgica está aperreado. O do Nepal ficou sem trono. Algumas dos eventos mais felizes do ano foram, como sempre, algunsdivórcios e demais desquites. A senhora Robin Wright Penn já não é Penn. Deus, ao contrário do que diz o catequista Dawkins, existe.