28.2.08

Como se não fosse uma língua

Quando saudei numa crónica a recente reintrodução (facultativa) do latim na missa, houve gente, inclusive católicos, que achou a ideia “reaccionária”. Quem diz isso, não percebe o que está em causa. A questão é estética e simbólica, como explicaram Borges, De Chirico, Auden, Bresson, Dreyer, Montale, Waugh ou Graham Greene num famoso manifesto. Luís Miguel Cintra, numa excelente entrevista à Pública, volta ao tema:

«Acredito é que existe um ritual capaz de unificar milhões de sensibilidades diferentes. A importância desse ritual é enorme. Sempre reagi muito contra a missa em vernáculo porque achava que se afastava da ideia de ritual. O meu pai dizia: “Tu és um reaccionário, não vês que as pessoas têm de perceber o que se está a dizer? Tem de se dizer a missa em português, em latim não se percebe”. Para mim, é como se o latim não fosse uma língua, mas uma linguagem simbólica que fizesse parte do próprio ritual. E achava isso importantíssimo como factor de unificação, pela abstracção, de todas aquelas sensibilidades diferentes».

Cintra explica com elegância a necessidade do latim: o latim é uma linguagem ritual. Unifica pelo ritual as diferentes sensibilidades. E, acrescento eu, distingue uma eucaristia dum acampamento de escuteiros ou duma sessão de karaoke.