21.3.08

Tom Stoppard

Tomas Straussler, aliás Tom Stoppard, aliás Sir Tom Stoppard, é um caso especial no teatro inglês. Pelo seu percurso, pelas suas ideias, e pelo seu sucesso. Judeu nascido na Morávia (Checoslováquia) em 1937, teve a infância fustigada pela Guerra Mundial. Os pais fugiram para Singapura, mas o pai morreu vítima dos japoneses; a mãe casa então em segundas núpcias com o major inglês Kenneth Stoppard, um defensor do Império e dos valores tradicionais. Mais inglês que os ingleses, o jovem Tom não prossegue os estudos, e anda pelo jornalismo e pela crítica teatral, até que uma produção amadora de uma peça sua, Rosencrantz and Guildenstern Are Dead (1966), caiu no goto do mais que influente Kenneth Tynan, que a trouxe para o National Theatre. Tomando como personagens duas figuras secundárias de Hamlet, Stoppard fez uma espécie de À Espera de Godot com trocadilhos e existencialismo de feira, dois homens que discutem infindavelmente o sentido das palavras e o sentido da vida. Perguntado sobre o tema da peça, Stoppard respondeu: «It's about to make me rich». Rico não terá ficado logo, mas tornou-se um nome mundialmente conhecido e incessantemente representado. Os seus primeiros trabalhos, como The Real Inspector Hound (1968) e After Magritte (1970) são divertimentos mais ou menos grotescos. Mas em 1972 surge Jumpers, modelo da peça stoppardiana: intelectuais que saltitam entre ideias, ao ponto de fazerem uma verdadeira ginástica acrobática em palco, enquanto esgrimem conceitos como o «relativismo amoral». Jumpers estabeleceu Stoppard como autor de um «teatro de ideias» dado através de jogos de palavras, anedotas, silogismos e aforismos. Ao mesmo tempo, as peças reflectiam as ideologias que mudaram o mundo; assim, Travesties (1974) junta Joyce, Tzara e Lenine numa farsa sobre as vanguardas modernistas. Sempre acusado de ser demasiado «clever», Stoppard argumenta que escreve peças porque não sabe o suficiente para escrever ensaios, artificio enganoso para quem mergulha a fundo nos temas que o interessam. Só num momento pareceu abordar temas mais autobiográficos: quando se divorciou da segunda mulher e teve um relacionamento muito noticiado com a sua actriz fetiche, Felicity Kendal. Dessa relação nasceu o seu texto mais pessoal, The Real Thing (1982), sendo que essa «coisa real» é naturalmente o amor, certeza que sempre nos escapa. Stoppard nunca voguou nas águas do teatro comprometido, tal como praticado pelos seus compatriotas Osborne, Bond, Hare ou Brenton; a isso não são estranhas as suas inclinações políticas: apoiou os dissidentes do comunismo (como Havel) e manifestou simpatia por Margaret Thatcher, pecado inominável no meio intelectual. Também ficou conhecido pela sua militância na Amnistia Internacional. Arcadia (1993), uma peça sobre um elitismo cultural pastoral, The Invention of Love (1997), sobre o poeta e classicista A.E. Housman, prosseguiram as suas investigações intelectuais. Em 1997, foi feito Sir. Escreveu sempre abundantemente. As suas peças completas, em cinco volumes, incluem adaptaões de Tchekhov e Schnitzler e textos para a rádio. Também adestrou a mão escrevendo ou adaptando argumentos de filmes de sucesso como Brazil, O Império do Sol, A Casa da Rússia, Billy Bathgate e Shakespeare in Love. Levou ao cinema, sem grande sucesso, a sua primeira peça, com Gary Oldman e Tim Roth nos papéis principais. Em 2002, Stoppard completou a sua peça mais ambiciosa e mais celebrada, The Coast of Utopia, uma costa da utopia que é também sobre o «custo» da utopia: uma epopeia sobre os radicais russos de fins de oitocentos, que deve muito aos estudos de Isaiah Berlin. Rock 'n' Roll (2006), a sua peça mais recente, e que agora podemos ver em português, conta o segredo mais bem guardado da resistência ao comunismo: o rock'n roll, precisamente.

(no Ipsilon de hoje)