22.5.08

Torcato Sepúlveda (1951-2008)

Conhecíamo-nos dos jornais e de jantarmos na mesma mesa no poiso do costume. Tratou-me sempre com estranheza e delicadeza, com uma grande disponibilidade para as nossas imensas diferenças de opinião, sem que alguma vez tivéssemos discutido uma coisa assim tão banal como as «diferenças de opinião». Eu respeitava o Torcato porque ele era um jornalista de um mundo em extinção, exaltado nas convicções, culto, castiço na prosa e íntegro nas atitudes. Nos seus textos, o Torcato foi, como lhe chamou o Francisco José Viegas, um «céptico entusiasta». No convívio, um anarquista educado. Mesmo nas suas fúrias mantinha um inabalável sentido de justiça. Separava as ideias das pessoas que defendem certas ideias, o que é um índice de civilização. Camiliano de Braga e surrealista lisboeta, era vivo e polémico, mas algumas vezes dei com ele perdido num silêncio lá longe, talvez meditativo ou talvez melancólico. Era um jornalista que eu gostava de ler e um homem que eu gostava de encontrar. À mesma mesa.