25.7.08

Os carrascos

Tenho às vezes que ver filmes sem legendas falados em línguas que não conheço. É uma experiência quase sempre incomodativa ou entediante. Mas já tive um deslumbramento: Der Verlorene (1951), único filme realizado por Peter Lorre (em alemão). Percebi praticamente tudo, mesmo sem compreender os diálogos. É uma espantosa e corajosa abordagem ao passado alemão, feita pouco depois do fim da guerra sem sentimentalismos nem paninhos quentes. Em Der Verlorene o nazismo não aparece como um «acidente» ou um «enigma», mas como uma condição inscrita na história da Alemanha e no seu presente de 1951. É uma visão tétrica de «willing executioners» e de estratategemas oficiais para encobrir a verdade incómoda. Na Alemanha, o filme aguentou dez dias em cartaz e caiu no esquecimento. Lorre voltou rapidamente a Hollywood e aos seus papéis malévolos ou castiços. Talvez o tema sombrio (e cheio de sombras expressionistas) ajude, mas o certo é que um filme que resiste à barreira da língua só pode ser um grande filme. Der Verlorene é um grande filme.