O corpo inteiro
O dispensável remake de Funny Games exibe o corpo seminu de Naomi Watts em várias cenas longas. Se a nudez de Emmanuelle Béart em La Belle Noiseuse era de algum modo «atenuada» pela sua situação estática, o erotismo de Watts também é diminuído pelo facto de a vermos humilhada e brutalizada. No entanto, tal como ninguém esqueceu o corpo nu de Béart, ninguém fica imune a Watts seminua. É um corpo desejável mas credível: ossudo acima do peito, esquelético nas costelas, cheio nas ancas e com alguma celulite nas coxas. As maminhas de Naomi, com mamilos pronunciados, acusam a gravidade e não são aqueles balões esticados de muita estrela hollywoodesca. É uma mulher que cuida de si mas que tem a idade que tem (39) e já foi mãe.
A dada altura a conversa dos jovens torcionários anda à volta da idade dela e da existência ou não de «jelly rolls» na sua anatomia. É uma discussão sádica? É, mas de um sadismo banal no «Ocidente». Acontece que nem todas as actrizes se prestavam a essas cenas. Algumas só se despem para mostrar que têm ido ao ginásio ou à faca. O corpo despido de Watts, pelo contrário, é um corpo normal de uma mulher atraente (embora diabos me levem se eu conheço alguma mulher daquela idade tão atraente como ela). Watts nasceu em 1968 e tornou-se uma estrela já tarde, em 2001. Hoje, é uma mulher desejável de 40 anos numa cultura em que as mulheres desejáveis têm 22.
Em Funny Games ela aceitou o desafio de uma seminudez diferente: em vez da excitação, somos convidados à contemplação. E por uma vez o corpo faz integralmente parte de uma actriz (em vez aparecer em substituição dela). E por uma vez a beleza parece possível e não uma ilusão da fábrica de ilusões.