26.9.08

A calma

No dicionário pavesiano editado pela Mondadori em 2001, Roberto Gigliucci escreve uma entrada inesperada: «Calma». A «calma» em Pavese é quase uma palavra de código. É a «masculinidade» mitológica que ele atribui aos homens potentes e seguros de si. «Calma» é na verdade uma expressão estranhamente branda para designar essa condição que Pavese almejava, e esconde a violência latente do seu conceito de masculinidade (e a violência patente da sua misoginia). Pavese tem aliás reacções diferentes à calma e à violência em matéria sexual. Quando Tina lhe diz (em 1937) que ele é incapaz de satisfazer uma mulher, ele interpreta isso (e justamente) como uma grande violência, e nunca mais esquece a frase. Estranhamente, quando consuma a relação com Constance (em 1950), elogia a ternura e a paciência dela. Seria uma reacção normal noutra pessoa, mas é bizarra em Pavese, um homem que sempre rejeitou as mulheres que gostavam dele. Bizarra e paradoxal: a «ternura» e «paciência» de Constance (aliás surpreendentes) são um insulto à «calma». Um homem «calmo» não precisa de «ternura». E ainda menos de «paciência». A «potência» não perde tempo com sentimentos. Vemos então que a ausência momentânea de cinismo deixou Pavese desprotegido. E quando Constance o deixa, ele já não tem tempo de recuo.