17.9.08

Retrato de um amigo

Calvino disse que era a mais bela evocação de Pavese: é «Ritratto d’un amico», de Natalia Ginzburg, texto incluído em Le piccole virtú (1962). A viúva de Leone Ginzburg, intelectual assassinado pelos nazis, fez nesta dezena de páginas uma melancólica evocação da cidade de neve e névoa («a nossa cidade») e de um melancólico amigo dos Ginzburg («o nosso amigo»). Confessa que não distingue Turim e Pavese e que antes dos poemas de Pavese nem imaginava que Turim fosse digna de poesia. Ela lembrava-se bem dele e dos seus paradoxos: um sujeito taciturno e veemente, exigente e ingénuo, agreste e gentil. Pavese, sugere Natalia, tinha as virtudes e os defeitos de um adolescente: “(…) às vezes, ficava muito triste: mas nós pensávamos que ele se ia curar dessa tristeza quando decidisse tornar-se adulto» (itálico meu). A tristeza de Pavese exprimia uma incapacidade para a felicidade. Ele sofria com o mal e não se alegrava com o bem. Incapaz de uma «vida normal», decidiu um dia que era também incapaz de viver. E é comovente a passagem em que Natalia Ginzburg lembra que ele escolheu morrer em Turim, no verão, quando o tempo fica quente e a cidade vazia.