22.12.08

Brideshead revisited

A versão para cinema de Brideshead Revisited foi vilipendiada por toda a gente, e eu sou o primeiro a concordar que era fraquinha; mas a minha relação emocional com o romance de Waugh faz-me ter uma simpatia irremediável mesmo por este fracasso. Brideshead (o filme) tinha que competir com Brideshead (a série), e isso nunca na vida poderia fazer bem. A alternativa foi apostar tudo numa adaptação fiel, explicitando apenas a componente homossexual e comprimindo algumas cenas (o interlúdio veneziano é muito chocho). Em termos de «valores de produção» tudo certinho, tudo BBC: palácio e vestidos e Oxford e o mais. O problema está nos actores e na concepção, digamos, «ideológica». Matthew Goode é demasiado «good», um rapaz entre o deslumbramento e melancolia, mas sem verdadeira densidade. Hayley Atwell representa bem o lado coquette e as restrições religiosas, mas não é uma figura verdadeiramente interessante e ainda menos uma aristocrata. Emma Thompson é uma Lady Marchmain severa e antipática, mas em nenhum momento dá a entender a dimensão trágica da religião. Brideshead Revisited (o romance) pode ser lido de muitas maneiras, mas tem de passar forçosamente pela ideia de uma crença religiosa que não é apenas «castradora» mas também vivida como moralmente imperativa. Se as questões do pecado, do divórcio e da fé são um disparate, Brideshead é um disparate. E claro que para uma audiência moderna, as questões religiosas são disparatadas. É preciso empatia para sentir o drama em torno da morte de Lord Marchmain, e tudo o que se joga nele aceitar ou não a extrema-unção. No romance, Charles faz de incréu (quase até ao fim), revoltado com os códigos que não entende e não aceita. Mas Evelyn Waugh, um convertido, percebe que são esses códigos que dão sentido àquelas vidas e sobretudo àqueles aristocratas historicamente condenados. A ideia de decadência e de fim é essencial em Brideshead, e tem a sua figuração farsesca em Hooper, o soldado bronco que representa os «novos tempos». Mas Hooper só funciona se for dado em contraponto. Quando Hooper parece sensato, então Waugh tinha razão mas o romance torna-se ilegível.