31.12.07

Bom ano e até já

the sun came up above the strange white plain.
blood red flowers all wet with rain
and the spirit wasn't really willing anymore,
but the flesh was very very strong.
and i've got very little money left, and i've got no sense,
but I'll have none of your god damned impudence.
the sun came up above the new white fields,
everything was new again.
pure power, stripped of meaning,
sky burning, spring cleaning.

daisies on the hillside like cancer on the skin.
pretty little yellow eyes that flutter in the wind,
I'd be grateful my children aren't here here to see this,
if you'd ever seen fit to give me children.
and my defenses may be working with a skeleton crew,
but I'll be skinned alive before I'll take this from you.
the sun came up above the ocean out west,
all the colors of the rainbow.
stand up straight, you can see the house leaning.
day breaking, spring cleaning.

(The Mountain Goats, «Baboon», álbum Coroner's Gambit, 2000)

About a girl

Disse o ano todo que quase nenhum destes textos era sobre ti e eram quase todos.

O biénio

Sempre detestei «balanços do ano» (embora goste muito de listas). O que é que me deu agora para fazer balanços sucessivos deste ano, por escrito e em conversa e em pensamentos? 2007 foi um ano desenxabido e que não adiantou nada. Mas talvez pense nele como o encerramento de um «biénio», o biénio 2006/07, uma época muito negra na minha vida. Talvez o «balanço» seja uma forma de achar que resolvo mentalmente coisas que ainda não estão resolvidas, ou que estão embora eu minta a mim mesmo dizendo que não. Talvez o balanço (como todos os discursos) seja mais um pazada de terra sobre o cadáver, um cadáver adiado (mas não muito). Foi um ano em que testei as amizades até ao máximo, sem que fosse essa a intenção; um ano em que aceitei as coisas mais selvagens que me disseram (mesmo quando me diziam o contrário, por «preocupação»); foi o ano da ausência, da abstenção, da falta de comparência, do silêncio infindável. Um ano de «exílio interior», não para «fugir do mundo» (o que aliás é impossível) mas para me forçar a aceitar as conclusões definitivas que o mundo sobre mim tinha anunciado. Foi um ano em que tive vergonha, muita vergonha, tanta vergonha que acho que antes deste ano não sabia o que significava a palavra vergonha. Foi um ano (um «biénio») em que tropecei em ilusões e depois me confrontei com violência com aquilo a que talvez chamem o meu «valor», que eu conhecia mas que não quis aceitar assim tal qual me foi dito (sem ser dito, sem nunca ser dito, essas coisas obviamente não se dizem). Foi o ano em que tentei a «fortaleza», como virtude moral e apenas consegui a fortaleza como sítio fortificado. E agora que o ano termina, ainda acho insuficientes estas muralhas.

2007

A figura do ano, por razões políticas óbvias, seria sempre Sarkozy. E agora a figura do ano é ainda mais Sarkozy, por razões estéticas ainda mais óbvias. Respect. No mais, 2007 foi um ano merdoso ou banal. O governo confirmou os tiques autoritários e acaba tomando de assalto o maior banco privado português. Cavaco, depois das «promulgações discordantes» dos primeiros tempos, esteve geralmente bem. O aborto foi despenalizado, marcando o princípio do fim do catolicismo em Portugal e o rebuçado anual que a esquerda terá (em pequenas doses) até 2009. A ASAE fechou a Ginginha e a IGAC fechou o Quarteto. O caso Maddie deixou mal os nossos polícias e os jornais ingleses. Falou-se muito em «pais biológicos» e na OTA. A TLEBS foi com os porcos, mas com o Acordo Ortogáfico as consoantes mudas vão à vida, por razões que nem o Agualusa me conseguiu explicar. O Tiepolo ficou cá, e a coleccção de discos de fado também. A exposição Amadeo foi um sucesso insólito. Chegou às bancas a Time Out Lisboa e abriu a livraria-com-livreiros Pó dos Livros. Os DVD da Midas são uma verdadeira cinemateca ao domicílio. O ano foi excepcional para dois moços talentosos, o Ricardo e o Ronaldo. Mas a «classe dirigente» caiu na sarjeta (Berardo, Marinho, Menezes). Tentaram vender-nos a mesma coisa com um nome diferente («Tratado» em vez de «Constituição»), explicando que temos que avançar sem fazer perguntas porque este assunto é «demasiado complicado» para as nossas almas simples. No «estrangeiro», todos os lamaçais do mundo estão piores do que estavam antes, começando pelo Médio Oriente, esse dominó de desgraças. Ratzinger tem convencido os cépticos (como eu) e alguns agnósticos e desiludido os ultras. Convivemos o ano todo com gente que não presta (Ahmadinejad, Chavez, Putin, Castro, Khadafi, Mugabe). Houve alguns mortos célebres (Benazir Bhutto, Ieltsin), algumas despedidas por exaustão (o estratega Karl Rove, o convertido Tony Blair e graças graças graças a Deus o escroque Chirac). Doris Lessing ganhou o Nobel. Amy Winehouse e Lindsey Lohan portaram-se outra vez mal. Owen Wilson portou-se tão mal que quase morreu. Anna Nicole Smith morreu mesmo. Em compensação, Al Gore subiu aos altares ainda em vida. Angelina Jolie continua com uma furiosa paixão pela adopção. Os Radiohead fizeram um manguito à indústria discográfica. Os reis estiveram consoante. O de Espanha teve um grito de alma magnífico. A de Inglaterra chegou aos 80 anos com uma dignidade de que nunca serão capazes as princesas tablóides. O da Bélgica está aperreado. O do Nepal ficou sem trono. Algumas dos eventos mais felizes do ano foram, como sempre, algunsdivórcios e demais desquites. A senhora Robin Wright Penn já não é Penn. Deus, ao contrário do que diz o catequista Dawkins, existe.

Girls on film 2007

Duas listas: a primeira com actrizes conhecidas, algumas delas com estatuto de sex-symbols; a segunda com actrizes mais jovens, ou agora reveladas, ou que vêm da televisão, ou totais desconhecidas. O critério é meramente estético, embora haja aqui uma dezena de boas actrizes. Os filmes (todos estreias) são em geral fracos ou maus. Se não fossem estas senhoras, tinha exigido o dinheiro de volta.

1.
Robin Wright Penn, Breaking and Entering
Parker Posey, Fay Grim
Jennifer Connelly, Blood Diamond
Keira Knightley, Domino
Britanny Murphy, Love and Other Disasters
Naomi Watts, The Painted Veil
Eva Mendes, Ghost Rider
Rachel Weisz, The Fountain
Jessica Biel, Next
Sienna Miller, Factory Girl
Halle Berry, Perfect Stranger
Carrie-Anne Moss, Snow Cake

2.
Alexandra Maria Lara, Control
Alice Taglioni, La doublure
Beau Garrett, Turistas
Ebru Ceylan, Climas
Eglantine Rembauville-Nicolle, Scenes of a Sexual Nature
Elena Anaya, In the Land of Women
Elisha Cuthbert, Captivity
Katie Cassidy, Black Christmas
Kristen Stewart, The Messengers
Malin Akerman, The Heartbreak Kid
Maria-Josée Croze, Ne le dis à personne
Marina Hands, Lady Chatterley
Melissa George, 30 Days of Night
Michelle Monaghan, The Heartbreak Kid
Olivia Wilde, Alpha Dog
Piper Perabo, Because I Said So
Rachel Bilson, The Last Kiss
Rosamund Pike, Fracture
Rose Byrne, Sunshine
Vanessa Ferlito, Death Proof

Comentários não há. Mas o Miguel está à vontade para a ilustração.

30.12.07

Um truque com uma faca

Um dos melhores títulos de poesia que conheço é dos Selected Poems de Michael Ondaatje de 1979: There's a Trick With a Knife I'm Learning to Do. Não só ficamos na dúvida sobre qual será o «truque» em questão (a poesia?), como somos informados de que quem faz o truque ainda está a aprender como se faz. E temos o privilégio de aprender ao mesmo tempo.

O truque da felicidade

Uma felicidade sem alegria. Ou seja: o domínio dos conceitos abstractos sobre o alvoroço. Um truque como qualquer outro, afinal.

Argumentos de classe

«Não uses argumentos de classe», pede um amigo numa discussão, mas isso é pedir de mais. Eu uso sempre argumentos de classe, como aliás toda a gente. É raríssimo encontrarmos alguém que não denuncie de algum modo a sua origem classista: nas opiniões, nos gostos ou nos temas. Há naturalmente alguns «desvios», da gauche caviar à direita «proletária», com as suas contradições e snobismos invertidos, mas mesmo aí encontramos um cinismo ou uma mobilidade social que explicam a coisa. A classe social, como a anatomia, é o destino.

Não me entendam mal: sou alheio a toda a «cumplicidade de classe» e tenho absoluto desprezo pela intolerância social. Mais: desde há mais de uma década que a minha vida tem sido uma acumulada frustração das expectativas «sociais» que me competia concretizar. Não sei de que classe sou, em que categoria me coloca a sociologia. Mas reconheço uma sensibilidade de classe que se nota em tudo, do mais trivial ao mais importante. Da literatura que aprecio aos nomes de que mais gosto, dos objectos que prefiro às mulheres que acho bonitas. Tudo mas tudo tem origem de classe. Nesse aspecto o senhor das barbas estava certo.

Assumir tal «condição» é naturalmente antipático, porque vivemos constrangidos num discurso falso de «sociedade sem classes» (a única excepção aceitável: o self-made man). Mas eu, talvez já imaginem, não acredito em sociedades sem classes. Mesmo quando as revoluções enforcam os aristocratas há sempre quem prepare o incómodo cadafalso e quem comodamente assine o decreto.

Os novos vinte

TERRY: You're not a kid, all right? You are not some teenager who can run all over doing that, because it sounds stupid. (...) and it's a little embarassing (...) You are a grown man.

DREW: Thirty is the new twenty.

TERRY: Yeah, well, you're thirty-five.

DREW: So? That only makes me twenty-five then.

(Neil LaBute, In a Dark Dark House, 2007)

O pequeno público

Être éditeur consiste à publier des livres que les gens n’ont pas envie de lire. Isto dizia o recentemente falecido Christian Bourgois, um dos mais notáveis editores contemporâneos. É uma frase que de certeza deixará atónito um «gestor da indústria livreira», como os que agora avançam para o controlo das editoras portuguesas. Bourgois (editor de Borges, Junger, Burroughs, Gombrowicz, Perec, Pessoa, entre muitos outros) sabia que a edição era uma paixão, porque os grandes editores são desde logo leitores apaixonados. Se um editor apenas vai ao encontro dos gostos já existentes, e dos gostos fáceis e/ou maioritários, então é um comerciante de secos & molhados como qualquer outro. O editor edita para os leitores que existem mas também cria os seus leitores, através de afinidades, cumplicidades, descobertas, surpresas, apostas e ousadias. Temo que as editoras portuguesas agora «concentradas» se guiem em absoluto por um plafond mínimo de vendas (livros com menos de 4 mil leitores não ficam no catálogo) e por um seguidismo face às formulas comerciais e às modas do momento. Temo que nestas mega-editoras não haja espaço para autores que não escrevem para «o grande público». E eu gosto tanto mas tanto de escritores que escrevem para o «pequeno público».

29.12.07

O paradoxo do Natal

Talvez o melhor Natal da última década: um Natal sem alegria. Se extrairmos a alegria, nada de mau acontece. Num Natal ou noutra ocasião, participamos nos rituais todos e ignoramos os rituais todos, repetimos por costume e convivência e quase necessidade, mas não significa nada, não custa nada, não fica nada. Estamos e não estamos, nada nos toca. Um Natal inteiramente sem alegria, isto é, inteiramente sem sofrimento.

Fazer falta

Tomamos conhecimento de que alguém «conhecido» morreu e isso é quase sempre apenas uma notícia. E depois há uns quantos cuja morte realmente lamentamos. Em 2007 fiquei triste ao ter a notícia da morte de uma vintena de intelectuais e artistas.



Aqueles que conheci e estimei, como Fiama e EPC.

Aqueles que eram autores «cá de casa», como Bergman e Gracq.

Aqueles de quem gostava muito, como Antonioni ou Mailer.

Aqueles que li com gosto, como Fernanda Botelho, Elizabeth Hardwick, Ryszard Kapuściński, Alberto Lacerda, Grace Paley ou Kurt Vonnegut.

Aqueles que respeitava intelectualmente, nas concordâncias (René Rémond) como nas discordâncias (Richard Rorty).

Aqueles que recordo acima de tudo por causa de um filme, como Jean-Claude Brialy (Le Genou de Claire), a novíssima Solveig Dommartin (As Asas do Desejo) ou Deborah Kerr (From Here to Eternity).

Lee Hazlewood, cowboy na Suécia.

E Michael Hamburger, que me deu a conhecer (em inglês) quase todos os grandes poetas alemães.

Esses fazem falta.

Best of 2007: notas finais

BLOGUES
Não faço ideia o que sejam os «melhores blogues portugueses». Há simplesmente aqueles de que gosto mais e aqueles que mais leio, geralmente por causa de afinidades de gostos (que não de «opiniões»). Não li de todo blogues de temas «públicos» ou «políticos», e poucos blogues colectivos. A minha lista contém quase todos os blogues que segui com regularidade ao longo do ano de 2007, com excepção dos seis ou sete de amigos próximos e de uma ou outra novidade que fui espreitando. Os blogues do maradona e do Tiago Cavaco estão entre os meus favoritos desde o princípio das suas bloguices. Os blogues do Francisco também. Mais recentes são do Luís Miguel, do Sérgio, do Lourenço e do Tiago Galvão. O Deus criou a mulher é uma instituição de utilidade pública (ou será de solidariedade social?), e o Miguel devia poder assinar o seu blogue como «investigador», tal o tempo que passa à procura das provas da existência de Deus. O única destes blogues que descobri este ano foi o Vontade indómita, que em Nova Iorque duvida todos os dias se foi Deus ou o Diabo (ou talvez uma parceria) quem criou a mulher. O blogue do ano é naturalmente o blogue que mais vezes citou o meu crítico literário preferido, o Pastoral portuguesa, do «Rogério Casanova» ou lá como é que ele se chama.

DISCOS
Não estão aqui os Radiohead, porque espero pelo CD tradicional (à venda amanhã). Também só ontem comprei o Springsteen, que dizem que é catita. Vou certamente gostar de outra aquisição ainda por desembrulhar, uma antologia dos discos a solo de Robert Forster e Grant McLennan (Go-Betweens). Os dez mais foram fáceis de escolher. Começo pelos que fazem música que não é o meu género: os festivos Arcade Fire (que vi ao vivo), o ultra-gay Patrick Wolf («the magic position»?) e o «retro» Richard Swift, gente cujos álbuns anteriores já tinham estado nas minhas listas de outros anos. Sou reaça mas não tanto. No domínio das guitarras, gostei dos festivos The Shins (anunciados ao mundo por Natalie Portman aqui há uns anos), a surpresa Blonde Redhead (que vi ao vivo), a sôdona Kristin Hersh (com um título muito foleiro mas um belo disco), os regressados e potentíssimos Dinosaur Jr. (com Lou Barlow e tudo) e, claro, essa maravilha de lowness que é Boxer, com a secção rítmica chegada à frente e os epigramas de cão batido. A quota «autorista» é preenchida pela canadiana vivaça canadiana Feist e por Iron and Wine, um compositor de mão cheia, desta vez com mais instrumentos do que nos discos anteriores juntos. Se os EP contassem, teria de entrar também o sublime disco de covers de Bonnie Prince Billy. Decepção do ano: os discos todos dos clones de Joy Division, que até se tinham estreado benzinho. Reedição do ano: só pode ser mesmo Colossal Youth, porque não conheço nada tão elíptico assim tão colossal.

FILMES
Foi um ano pouco entusiasmante, excepto o meu abundante entusiasmo com um actor, Ryan Gosling, o melhor actor jovem do cinema americano depois de Edward Norton (e «depois» quer apenas dizer «mais novo que»). Daí o meu filme do ano, um independente bom com uma interpretação colossal: Half Nelson (também gostei de Gosling num filme curioso, Fracture, que ainda por cima ia de encontro às minhas embirrações do momento). Outro actor agora revelado: Joseph Gordon-Levitt, que já tinha apreciado em Brick e se esfalfou tranquilamente em Mysterious Skin e The Lookout. Os autores americanos estão devidamente representados: o clássico Eastwood, reflectindo sobre a guerra; o chanfrado Lynch, cujo filme não saberia defender racionalmente mas que me agarrou pelos colarinhos; Tarantino, num puro gozo narrativo trashy (e que diálogos); Fincher, num jogo arriscado de mostrar o aborrecimento de uma investigação; e Gus Van Sant, uma derivação mais abstractizante de Elephant, com câmara fluida e adolescentes with issues. O cinema europeu não esteve em grande, a meu gosto, com excepção da versão nada escandalosa de Lady Chatterley, que melhora um romance catequético; As Vidas dos Outros, sobre a RDA, com mil e um dramas éticos no rosto silencioso do entretanto falecido Ulrich Mühe (que apenas rivaliza com o inexpressivo Aurélien Recoing); e Control, que aliás me merece bastantes reservas, mas que me parece em todo o caso visualmente impecável e o melhor biopic rock desde Sid & Nancy. Finalmente, no ano da morte de Antonioni, o filme antonioniano de 2007: Climas, Nuri Bilge Ceylan, com paisagens e metáforas e incomunicabilidade e tudo. Gostava muito de ter gostado de Little Children mas não gostei. O zero mais redondo vai para a estopada new age The Fountain, que no entanto tem uma Rachel Weisz deslumbrante. E depois houve muitos DVD, um ano em grande. E uma editora nova com um catálogo magnífico: a Midas.

LIVROS

Best of 2007: Blogues



As aranhas, Luís Miguel Oliveira
Auto-retrato, Sérgio Lavos
A causa foi modificada, maradona
Complexidade e contradição, Lourenço Ataíde Cordeiro
Diário, Tiago Galvão
E Deus criou a mulher, Miguel Marujo
A origem das espécies, Francisco José Viegas
Pastoral portuguesa, Rogério Casanova
Vontade indómita, Pedro Duarte Bento
Voz do deserto, Tiago Cavaco

28.12.07

Best of 2007: Filmes



Cartas de Iwo Jima, Clint Eastwood
Climas, Nuri Bilge Ceylan
Control, Anton Corbijn
Half Nelson, Ryan Fleck
Inland Empire, David Lynch
Lady Chatterley, Pascale Ferran
Paranoid Park, Gus Van Sant
À Prova de Morte, Quentin Tarantino
As Vidas dos Outros, Florian Henckel von Donnersmarck
Zodiac, David Fincher

Best of 2007: Discos



Arcade Fire, The Neon Bible
Blonde Redhead, 23
Dinosaur Jr., Beyond
Feist, The Reminder
Iron and Wine, The Shepherd's Dog
Kristin Hersh, Learn to Sing Like a Star
The National, Boxer
Patrick Wolf, The Magic Position
Richard Swift, Dressed Up for the Letdown
The Shins, Wincing the Night Away

23.12.07

Best of 2007: Livros



Aprender a rezar na Era da Técnica, Gonçalo M. Tavares, Caminho

Ética, Dietrich Bonhoeffer, Assírio e Alvim

Os Filmes da Minha Vida - 2º Volume, João Bénard da Costa, Assírio & Alvim

A Modernidade, Walter Benjamin, Assírio & Alvim

Pais e Filhos, Ivan Turguéniev, Relógio D'Água

O Que Foi Passado a Limpo. Obra Póetica, Armando Silva Carvalho, A. Alvim

Século Passado, Jorge Silva Melo, Cotovia

Todo-o-Mundo, Philip Roth, Dom Quixote

A Torre do Desassossego, Lawrence Wright, Casa das Letras

Tudo o Que Sobe Deve Convergir, Flannery O'Connor, Cavalo de Ferro

A raiva e o orgulho



(para J, com as minhas desculpas)

22.12.07

Best of 2007

Livros: A minha votação nos «dez livros do ano» do Ipsilon. Lista atenta.

Discos: Pop/rock, geralmente em sentido estrito. Lista restritiva.

Filmes: Estreados em sala. Lista exaustiva.

Blogues: Aqueles que li com mais regularidade e gosto. Lista subjectiva.

20.12.07

Cabelo castanho

And if I ever see her again
Just walking by with some new guy
I know that we will need to pretend
And hope our eyes keep telling lies

Sit on the back porch and wonder ‘bout her
What is she doing right now?
Making somebody a happier man
Dying her hair back to brown

(Eels)

Momentos de glória

«Pedro Mexia» apareceu hoje no concurso televisivo do Malato como uma das hipóteses de resposta. O concorrente escolheu precisamente essa hipótese. Era a resposta errada.

Diz que foi offside

Socrates has scored! The Greeks are going mad, the Greeks are going mad. Socrates scores, got a beautiful cross from Archimedes. The Germans are disputing it. Hegel is arguing that the reality is merely an a priori adjunct of non-naturalistic ethics, Kant via the categorical imperative is holding that ontologically it exists only in the imagination, and Marx is claiming it was offside.

(de um sketch dos Monty Python, e dedicado a)

19.12.07

35 (correlativo objectivo)

I grow old … I grow old …
I shall wear the bottoms of my trousers rolled


(Eliot)

Excesso

No aeroporto, paguei excesso de peso. Ninguém devia ter que pagar por aquilo que é.

10.12.07



«speech after long silence» (ou o contrário)

5.12.07

Sobre a fortaleza (2)

4.12.07

Sobre a fortaleza (1)

Tentei uma tradução, uma versão, uma adaptação ou uma «mudança para português». Não consegui. Se desrespeitasse alguma das rimas, a tradução não se aguentava. Aliás, mesmo que encontrasse rimas adequadas, faltava ainda o jogo com o cliché, a ambiguidade e as aparentes (e muito propositadas) redundâncias. Eis então a versão original de «Most of the Time», do injustiçado álbum Oh Mercy (1989), de Bob Dylan.


Most of the time
I'm clear focused all around
Most of the time
I can keep both feet on the ground
I can follow the path, I can read the signs
Stay right with it, when the road unwinds
I can handle whatever I stumble upon
I don't even notice she's gone
Most of the time

Most of the time
It's well understood
Most of the time
I wouldn't change it if I could
I can't make it all match up, I can hold my own
I can deal with the situation right down to the bone
I can survive, I can endure
And I don't even think about her
Most of the time

Most of the time
My head is on straight
Most of the time
I'm strong enough not to hate
I don't build up illusion 'till it makes me sick
I ain't afraid of confusion no matter how thick
I can smile in the face of mankind
Don't even remember what her lips felt like on mine
Most of the time

Most of the time
She ain't even in my mind
I wouldn't know her if I saw her
She's that far behind
Most of the time
I can't even be sure
If she was ever with me
Or if I was ever with her

Most of the time
I'm halfways content
Most of the time
I know exactly where it all went
I don't cheat on myself
I don't run and hide
Hide from the feelings, that are buried inside
I don't compromise and I don't pretend
I don't even care if I ever see her again
Most of the time.

O azul e o vermelho

A estupidez

É difícil viver habitualmente depois de se descobrir que se é estúpido. Há quem leve menos tempo. Há quem descubra isso num instante. Há quem demore três décadas e meia. O último refúgio («ao menos não sou estúpido»), usado e abusado nos piores momentos ou nos mais ridículos. E agora, agora já não vale. Uma inteligência teórica sem voo. Uma inteligência prática cega. A estupidez, como o paciente forçado de um médico positivista, crânio medido e anotado, os estigmas da sua condição nas feições facínoras. Um burguês sem outros talentos especiais tem (quando tem) esse consolo, essa quase salvação: «ao menos não sou estúpido». Uma refrão refractário, como se todos os resultados não fossem prova em contrário. Uma conclusão conclusiva, como se a quantidade não fizesse qualidade. Um homem inteligente que, envolto no manto da sua inteligência, atravessa um rio em que não tem pé, percebe isso a meio, a mais de meio, não pode regressar atrás, não consegue chegar à outra margem, esteve sempre protegido pela sua inteligência, pela suposição dela, que agora fraqueja e logo se evapora. Um homem à morte que de repente se percebe estúpido. Que é estúpido por se ter abeirado assim da morte, confiado em fantasmas. Que por ter avançado assim, crente em assombrações, é estúpido, e definitivamente estúpido. Um homem que de repente não tem pé, mas não é aos seus pés que falta o apoio, é à sua cabeça, ao interior do sua cabeça, uma cabeça que não tem pé, que não tem conteúdo, que não fundamento, assim imóvel num rio que tentou atravessar a vau porque tinha a certeza, e que afinal atravessou porque é estúpido. Na verdade, só os familiares mais próximos deste homem podiam ter por ele alguma piedade, porque ele está onde está por sua vontade, por sua incompetência, porque não soube quem era quando atravessou o rio, porque se soubesse quem era não tinha atravessado. A verdade é que se soubesse quem era não tinha sido estúpido. E foi estúpido, colossal e irrecuperavelmente. Agora tem várias opções, todas elas estúpidas. Aos estúpidos não é concedida nenhuma opção inteligente.

3.12.07

O pêndulo

O pêndulo oscila. Só estaria na chamada «posição de equilíbrio» se não oscilasse. Só estará na chamada «posição de equilíbrio» se deixar de ser um pêndulo. Um pouco de paciência, que eu não demoro.

Valor sentimental

«Sentimental value?» I've heard of that.

Nikolai (Viggo Mortensen) para Anna (Naomi Watts), em Eastern Promises, de David Cronenberg

2.12.07

Naomi Watts

Houve um crítico que descreveu o registo mais comum de Naomi Watts como «a kind of flustered moral aggrievement», um tormento moral confuso. Mas não são apenas essa substância e esses estados que definem Naomi Watts. Há nela também uma entrega total que é acompanhada de uma enorme dúvida sobre os resultados dessa entrega. Nos seus momentos mais sofridos ou mais apaixonados, nunca Naomi exprime exactamente a alegria das pessoas para quem as coisas são fáceis e imediatas. Algumas vezes os seus papéis exigem uma quase ingenuidade (ou um jogo com a ingenuidade); mas parece quase sempre que ela já pensou naquilo que vai vivendo, talvez porque já o tenha vivido antes. É uma pessimista com esperança, não por ideologia mas por feitio.

Em Eastern Promises, o que acima de tudo canaliza isso é o instinto maternal (como já tinha sido de algum modo em fimes recentes como King Kong ou The Painted Veil). Naomi soube que estava grávida no começo das filmagens, e isso acentuou o que já estava no argumento: aqui todas as cenas vibrantes são de natureza maternal. Como todas as pessoas um bocadinho tristes e um bocadinho desesperadas, ela tem uma espécie de combustível que assegura a sua sobrevivência, que neste caso é a ternura. Todo o seu sofrimento moral passa nalgum momento por gestos ou pensamentos ternos, que aliás nem sempre se distinguem do próprio sofrimento.

Nesse sentido, Naomi Watts não tem felizmente nada a ver com a mulher concreta ou inventada dos tempos moderníssimos, como a «feminista capitalista» das séries televisivas ou a inocente vestida à puta dos videoclips. Naomi sofre e sente, como toda a gente, mas não tem medo de sentir e sofrer à frente dos outros. Essa coragem é que nos comove, porque a vemos tão pouco. E poucas vezes treme assim nuns olhos tão azuis e tão líquidos.

Prendas úteis (3): Everybody knows me at the dump



Innocent When You Dream: Tom Waits -The Collected Interviews, retrato de um «storyteller» genial e compulsivo, em frente a um jornalista como num estúdio de gravação. E não perguntem o que é «verdade» ou «imaginação»; qualquer bom contador de histórias vos dirá que isso são categorias simplistas.

1.12.07

O verbo galar (6)

Mónica tirou o quimono e começou a dançar como se tivesse um leque nas mãos. O corpo de Mónica era tão perfeito e os seus movimentos tão naturais que ele, deslumbrado, não conseguia tirar os olhos dela. (...) Nades, nádegas, nática, natura. Vendo em que parte do seu corpo os olhos de Lima Prado se fixavam mais tempo, Mónica parou, aproximou-se e, virando de costas, perguntou:

“Você quer passar a mão?”

[Rubem Fonseca, A Grande Arte (1983), ed. port. Campo das Letras]

Prendas úteis (2)