30.11.08

26.11.08

O massacre dos inocentes


















Este blogue caiu na abjecção. Tenho escrito coisas eticamente reprováveis, sabendo que são eticamente reprováveis. É um descontrolo controlado, como se as sentinelas se ausentassem das guaritas e deixassem entrar uma multidão tumultuosa e repugnante. Ou como um premeditado massacre dos inocentes. O espectáculo é tenebroso, bem sei. E também sei que os fins não justificam os meios. Mas este fim legitima tudo. Porque é o fim mais nobre de todos: a liberdade.

Uma num milhão

Amy Winehouse disse ao News of the World que se vai separar do marido, Blake Fielder-Civil. É que ele esteve preso, acusado de posse de drogas e de actos violentos, e entretanto a relação esfriou. «Só estávamos juntos por causa do sexo», explica Amy. Ela ainda «ama» Blake, mas sem sexo a sua relação já não existe.

Estou farto de santas marias gorettis, e é bom ouvir uma mulher que diz em público «só estávamos juntos por causa do sexo». E que abandona um homem que esteve preso.

Uma mulher que não teme a sinceridade, mesmo que fique mal na fotografia.

Uma num milhão.

De um castelo a outro



Saiu uma nova tradução portuguesa de D’un château l’autre (1957), o portentoso romance de Céline que descreve a corte dos colaboracionistas franceses em Sigmaringen, naquele que foi, juntamente com a comédia tétrica de Saló e os trágicos julgamentos de Moscovo, um dos momentos mais patéticos da história europeia.

D’un chateu l’autre chama-se nesta edição Castelos Perigosos (Ulisseia, trad. Clara Alvarez).

[há uma tradução da Dom Quixote que suponho esgotada]

25.11.08

O cobarde Robert Ford

Robert Ford já não era mais um «bandido procurado pela polícia». Agora era «o homem que matou Jesse James». Herói para alguns, traidor para outros, Ford ganha dinheiro no teatro representando o seu próprio papel, revivendo o momento em que matou o amigo pelas costas. Numa cena do filme I Shot Jesse James (1949), o xerife vai ajustar contas com Bob Ford e quando o avista, vira-lhe as costas. Seria um acto insensato noutras circunstâncias, mas aqui serve para demonstrar a fraqueza de Ford, o homem que mata pelas costas. E é Ford quem morre no fim.

Ticiano (featuring Kim Cattrall)

A morte presumida

Richey Edwards, dos Manic Street Preachers, desapareceu a 1 de Fevereiro de 1995. A 23 de Novembro de 2008, um tribunal decretou a sua morte presumida. Como vêem, mesmo 13 anos depois ainda temos que avançar com o cuidado de simples «presunções».

Com o odioso (2)

Breaking up is hard, but keeping dark is hateful

(David Bowie)

Darwin

A selecção sexual é importante no surgimento de novas espécies mas não é determinante. Esta é uma conclusão que se aplica, pelo menos, aos pintassilgos, de acordo com um estudo de investigadores portugueses divulgado na revista Evolution. O grupo de cientistas da Universidade de Coimbra (UC) estudou pintassilgos de todo o mundo (…) e percebeu que, ao contrário do que se pensava, as cores intensas dos pintassilgos machos não são determinantes na escolha de parceiro e, assim, no surgimento de novas espécies. Sobressai assim a importância da selecção natural que se baseia no acumular de diferenças entre populações que vivem em locais distintos. (Público)

As cores intensas definem a diferença e não a selecção sexual? Que maravilha. É toda a tua teoria que cai por terra, «minha querida». Quem vive pelo Darwin, morre pelo Darwin.

Petróleo, petróleo, petróleo

Quando eu discutia a política externa americana e falava de geoestratégia e de voluntarismo e de democracia e da teoria do dominó, os meus amigos de esquerda repetiam: «petróleo, petróleo, petróleo». Eu admitia que sim, que o petróleo, mas que não era só o petróleo, que diabo, não era só o petróleo.

Depois vieste tu, e contigo ficou claro que não há voluntarismos, estratégias, democracias nem dominós. Os meus amigos de esquerda tinham razão: «petróleo, petróleo, petróleo».

Antropologia

Ficámos (vejam bem) encantados com o pessimismo um do outro. E depois confirmámos o pessimismo um ao outro. Tudo está bem quando acaba mal.

24.11.08

Artes de palco

(...) «You're on a stage but people are a bit away. You're singing songs that are a personal expression, but you're not doing it individually to people; you're doing it to a mass of people». (...) But he does express himself honestly in music? «Yes. But it must be unhealthy if you only express yourself in that area and you don't express yourself in your real life. That's a bit fucked up, isn't it?» He often turns his statements into a question.

Jarvis Cocker, numa entrevista ao Guardian

Mortos vivos

Being dead, I suggest to Roth, seems indistinguishable from being a writer. He laughs and draws a vital distinction: «Well, we're the living dead».

Philip Roth, numa entrevista ao Los Angeles Times [via Pastoral Portuguesa]

Alice (correio dos leitores)

23.11.08

O ingénuo especial

Os ingénuos acham que o mundo é simples e depois ficam surpreendidos com um mundo complexo. Eu sou um ingénuo especial: achei que o mundo era complexo e afinal é bastante simples. Há instintos, interesses, desejos e lógicas de classe. Não há mais nada. É tudo tão linear que quem está de fora, sem conhecer as pessoas envolvidas, podia contar a história tal qual, como Buñuel, que adivinhava os finais dos filmes que via logo aos primeiros minutos.

Fascismo emocional



É uma espécie de fascismo emocional: estou a limpar a zona com napalm.

Acórdão

1. Depois de analisados os autos, apresentada a prova, interrogado o réu, ouvidos peritos e testemunhas, considera o tribunal estar suficientemente esclarecido acerca da acusação que impende sobre o réu. Assim, após deliberação:

2. O tribunal dá como provada a prática continuada de actos violentos por parte do réu, nos termos descritos nos autos, prática confirmada pelos peritos e testemunhas e, aliás, reconhecida pelo próprio.

3. O tribunal considera que não colhe o argumento da legítima defesa invocado pelo réu, dada a ausência de duas características essenciais: a actualidade e a proporcionalidade.

4. Quanto ao critério da actualidade, ninguém contesta que os actos violentos do réu aconteceram muitos meses depois dos actos a que supostamente respondiam.

5. Quanto ao critério da proporcionalidade, a violência praticada pelo réu é manifestamente excessiva para quem sofreu apenas (e hipoteticamente) actos de frustração de expectativas (uma matéria cível) ou de burla agravada (acusação que parece infundada).

6. Não se tratando de um acto de legítima defesa, as práticas violentas do réu são consideradas por este tribunal como gratuitas e graves.

7. Por conseguinte, e nos termos da lei penal, o tribunal condena o réu a [...]

(falta a última página)

Handsome devil



I crack the whip
And you skip
But you deserve it
You deserve it, deserve it, deserve it

20.11.08

A cadeira não descia

Já não ia há muitos meses ao Londres, e gostei de regressar, é um cinema de que guardo boas memórias e que sempre me deu uma sensação acolhedora, civilizada, coisa que hoje, com cinemas em centros comerciais, já quase não existe. Antes da sessão, quando me sentei naquelas cadeirinhas de molas que descem lentamente, lembrei-me de uma cena com mais de uma década: uma senhora velhota e pequenina que não tinha peso suficiente para que a cadeira descesse. Outras pessoas experimentaram a cadeira, e estava funcional, mas aquela anciã era demasiado leve e a cadeira para ela não descia. Na altura, aquilo foi apenas uma anedota. Hoje, sempre à coca de alegorias, imagino que há gente assim, que não tem as condições mínimas exigíveis, que tudo o que é natural e simples para os outros é para elas terrivelmente complicado ou mesmo impossível. Enough said.

19.11.08

Depois de muita hesitação o filho de Vladimir Nabokov decidiu publicar o livro que o pai disse querer ver destruído após a sua morte. «The Original of Laura» chega a Portugal dentro de alguns meses (pela Teorema) e, na próxima sessão dos Livros em Desassossego, é o pretexto para o debate sobre como lidar com o testamento e o espólio dos escritores. Na mesa vão estar a responsável pelo espólio de José Cardoso Pires, Ana Cardoso Pires, o poeta e crítico literário Pedro Mexia e escritor e director da revista LER Francisco José Viegas, a que se junta o editor da Teorema, Carlos da Veiga Ferreira, que elogiará três livros recentes que gostou de ver nas livrarias, e o escritor Jacinto Lucas Pires, que falará do seu novo livro de contos, «Assobiar em Público» (Cotovia). A próxima sessão dos Livros em Desassossego, a última, realiza-se uma semana mais cedo do que habitualmente, na quinta-feira, dia 20 de Novembro, pelas 21.30, na Casa Fernando Pessoa. A moderação é de Carlos Vaz Marques e a entrada é livre.

Os gigantes da montanha



Os Gigantes da Montanha, versão da última peça (incompleta) de Luigi Pirandello (Cornucópia, encenação Christine Laurent) é um espectáculo inesperado e fascinante. Em primeiro lugar, porque vemos que Pirandello continuou até ao fim fiel ao teatro sobre o teatro, embora alargando o que se entende por «teatro» ao reino do sonho, da fantasia, do inconsciente (o que é «real» e «imaginado» em Os Gigantes?). Isso vai ao ponto de a peça dentro da peça ser um outro texto de Pirandello (A Fábula do Filho Trocado). Depois, fiquei impressionado com a semelhança entre Cotrone, o mago e mestre-de-cerimónias (o sempre impecável Luís Miguel Cintra), e o Próspero de The Tempest, homem de sabedoria e encantamentos. Finalmente, há a questão do final, desse terceiro acto que nunca foi escrito. O segundo acto acaba com os Gigantes que se aproximam, e isso aumenta a sensação de ameaça, para além de deixar na dúvida o simbolismo desses tais Gigantes. O terceiro acto, cuja sinopse Pirandello ditou ao filho mas nunca escreveu, veria a troupe de comediantes representar a peça perante a criadagem dos Gigantes, que não a compreendem nem apreciam, filisteus que são, e que matam a sofredora Condessa Ilse. Um crime que ecoa o destino do poeta que se suicidou por causa da Condessa. É um final mais perfeito mas mais explicativo. O final escolhido por Laurent, com o som da terra a tremer à aproximação dos Gigantes, tem outra força. Encenações houve (a mais famosa é a de Strehler) que reconstituíram esse terceiro acto em falta, mas uns Gigantes identificados com o público ignaro e ávido não têm o mesmo impacto de uns Gigantes míticos e assustadores, que nunca vemos mas que ouvimos, como os bárbaros do poema de Kavafis, que existindo ou não são a razão de vida de quem os espera.

Cláudia Vieira


Carta aberta aos administradores da Triumph Portugal

Exmos. Senhores:

Peço um minuto da vossa atenção para contar um caso pessoal, que julgo no entanto ser uma experiência partilhada por outros portugueses honestos e pacatos. Se mais ninguém vos expôs a situação, eu sucintamente digo ao que venho. Compreendo perfeitamente que a vossa respeitabilíssima empresa tenha interesse em adquirir notoriedade e vantagens competitivas, e não ignoro que os outdoors e mupis são importantes nesse desígnio. Também percebo a importância de figuras públicas numa campanha publicitária, sobretudo quando são celebridades televisivas, gente respeitada, amada e desejada. Creiam pois que não vos censuro de modo algum a mais recente série de reclames à vossa lingerie. Procurais o sucesso e (perdoe-se-me o trocadilho previsível) o triunfo. Nenhum mal nisso. Há muito aliás que no espaço público nos habituámos a ver cartazes com todo o tipo de produtos, todo o tipo de marcas, e naturalmente todo o tipo de corpos jovens e atraentes. Mas sendo a nossa pátria um viveiro estético, e havendo tantas modelos (elas dizem «manequins») disponíveis e ansiosas por um trabalho que lhes dê visibilidade, porquê optar por Cláudia Vieira? Entendam o meu protesto: nada tenho contra Cláudia Vieira. Bem pelo contrário. Cláudia Vieira é a minha cidadã portuguesa preferida, pela qual faria esforços incomensuráveis como tornar-me vegetariano ou votar Bloco de Esquerda. Mas a beleza de Cláudia, de tão renascentista e clamorosa, é perturbadora se assim exposta em cada esquina, para mais com roupa interior, poses de doce entrega e aquele sorriso que o próprio senhor della Francesca nunca logrou conseguir, por mais pinceladas e pigmentos que tentasse. Embora eu aprecie desmesuradamente tal visão, que vai além do simplesmente belo e convoca espantos e terrores do sublime, tal como Burke os teorizou, embora eu a aprecie, digo, também me causa danos graves. Dores no peito, taquicardia, dificuldade de respiração, perda da fala, fraqueza nas pernas e braços, desmaios. São sintomas misturados de várias crises, mas é exactamente aquilo que sinto com estas campanhas da Triumph. Bem sei que Cláudia Vieira aparece todas as semanas na televisão e nas revistas, mas nesses casos podemos escolher o momento adequado para a ver ou não ver, ligando ou desligando a televisão, folheando ou tapando a revista em causa. Mas na rua, caros senhores, na rua andamos todos, pobres pedestres, gente tão diferente mas afinal tão demótica calcorreando as mesmas calçadas portuguesas, o mesmo alcatrão, as mesmas passagens pedonais. E não podemos evitar ver a nossa querida Cláudia em todo o lado, como os veteranos de guerra ouvem helicópteros das matas da Guiné numa insónia às 4 da manhã nos seus T2 em Alfragide. É impossível não ver, não olhar, não ser invadido por aquela ondulação de curva e contracurva, de côncavo e convexo. E isso causa as supracitadas maleitas, bem como, ao longo do dia, momentos de distracção, alheamento, rêverie, que ouso dizer prejudicam gravemente o funcionamento já das empresas, já das escolas, já dos serviços estatais. É por tudo isso, excelentíssimos senhores (e pedindo perdão pelo tempo que vos demorei), que humildemente solicito que os cartazes com Cláudia Vieira sejam removidos das nossas ruas, pelo menos das nossas ruas lisboetas, onde ao anoitecer há tal soturnidade, há tal melancolia, que sofremos com o absurdo desejo de a ver e de a não ver. Sabendo que há legiões de mulheres esbeltas, televisivas, namoradas de futebolistas, desfilantes nas passarelas de Milão, porque não contratar uma dessas esforçadas moças para os vossos anúncios, cumprindo todas as vossas legítimas vontades e aspirações comerciais, mas sem que a saúde, a paz de espírito e capacidade de laboração das pessoas em geral e deste que vos escreve em especial sejam afectadas terrivelmente, com efeitos para o futuro que mal podemos imaginar, e que vão do delirium tremens à insanidade. Considerai o meu caso, e daqueles que eu sem mandato represento. Há tantas mulheres, e tantas perfeitamente adequadas ao fim em vista, propulsoras de interesse e vendas. Mas Cláudia Vieira (que a paz e bênção de Alá estejam sobre ela) é demasiado íntima, demasiado nossa, demasiado uma rapariga portuguesa por quem tropeçamos de ternura (e chega de citações). Pensai um pouco no meu pedido, que não vos fará grande dano e será um acto de misericórdia para tanta gente, incluindo este vosso, e grato,

Pedro Mexia

18.11.08

Custam mais

Os homens mentem como respiram: vêem a mentira como um banal social skill. São em geral amorais. As mulheres mentem menos: mentem por vingança ou para preservar a sua imagem. São mais facilmente imorais. O que é «pior»? Não faço ideia. Mas eu nos homens nunca acredito, por isso as mentiras das mulheres custam mais.

Estética da recepção

Tenho escrito sobre episódios passados há 5 anos, há 10 anos, há 15. Os leitores acham que escrevo sempre sobre episódios da véspera. Estão no seu direito.

Da vida das cicatrizes

O Público conta que cientistas portugueses descobriram um processo de aceleração da cicatrização das feridas. Isto, que em si mesmo é notável, tem este acrescento: os cientistas vão partir daí para o estudo de como impedir o desenvolvimento de tumores. Nunca me tinha ocorrido tal coisa: que a cicatrização não garante a recuperação. Há complicações e degenerescências. E uma cicatriz pode transformar-se num tumor.

17.11.08

O império do verosímil

Vários escritores prestigiados (Coetzee, Fuentes, García Márquez, Pamuk, Rushie, Roth e outros) assinaram uma declaração conjunta dizendo que acreditam na inocência de Kundera, acusado de delação e colaboracionismo com o regime comunista. Os escritores atacam também o alarido mediático em torno dessa aparente calúnia. Yasmina Reza, por seu lado, escreveu no Le Monde que a acusação a Kundera não tem nenhuma resposta possível: Kundera pode negar uma vez (o que fez), mas depois só pode repetir a negação, pelo menos até haver provas mais concretas que sustentem as alegações. A delação cria um «acontecimento» que é fatal, sobretudo para alguém que escolheu o silêncio como modo da vida (fora dos livros). A calúnia circula porque é verosímil e, diz Jean Daniel, no império do verosímil a calúnia triunfa sempre.

A condição humana


Nunca

Ela nunca me mentiu. Nunca me enganou, nunca omitiu, nunca distorceu, nunca foi dissimulada, nunca inventou, nunca negou, nunca foi falsa ou traiçoeira, nunca fingiu, nunca foi hipócrita nem desleal. É verdade que foi uma das experiências mais violentas que tive até hoje. Mas foi também a experiência mais fantástica que tive até hoje. É uma coisa que acontece uma vez na vida. Estou grato por me ter acontecido ao menos uma vez.

O sacrifício

Na manhã seguinte demos um passeio pela quinta e falámos de coisas sérias com uma alegria inconsciente. Eu estava disposto a qualquer sacrifício. E disse isso a toda a gente: a ela, aos amigos dela, aos meus amigos, até à minha mãe: «estou disposto a qualquer sacrifício». Ela provavelmente achou que «um sacrifício» era uma coisa egoísta. Ambos católicos, víamos o esforço como uma forma de orgulho. E ela preferia a simplicidade.

O céu é dos violentos

O tipo que se embebedava e gritava com ela em público, atirando as mesas do restaurante ao chão. O tipo que a deixava trancada no automóvel quando discutiam. O tipo que ameaçava fisicamente qualquer homem que se aproximasse dela.

Todos estes homens foram mais importantes nas vidas delas do que eu. Elas respeitavam a violência deles. Eles faziam-se respeitar através da sua violência. A minha incapacidade para a violência confirmava aliás todas as suspeitas que elas tinham acerca de mim. Um homem incapaz de violência é um homem incapaz.

E agora que finalmente sou violento, já é tarde e inútil.

Com o odioso

Nunca odiei ninguém (e só uma vez estive quase). Mas agora decidi «ficar com o odioso» (curiosa expressão). Ficar com o odioso não é odiar (não tenho razões para odiar ninguém), mas assumir moralmente uma atmosfera negativa. Quem «fica com o odioso» aceita que saiu de um determinado choque uma pessoa pior do que antes. Eu sou hoje muito pior pessoa do que era há uns anos. E fico com o odioso disso, em vez de tentar vender a ideia de que sou uma «pessoa extraordinária» (como ela dizia). Não sou, sou de uma espécie muito fraca, e agradeço a todos os que me têm lembrado disso. Mas assim como há gente que perde a fé, têm que compreender que há momentos em que se «perde a moral». Não estranhem que seja assim. A moral é uma coisa que interessa a pessoas com esperança.

16.11.08

A ovelha negra

Leio esta frase mortal num texto do guatemalteco Augusto Monterroso: « (…) como naquele dia em que o hipócrita Abel se fez matar pelo seu irmão Caim para que este ficasse mal perante todo o mundo e não pudesse recuperar jamais» (A ovelha negra e outras fábulas, ed. port. Angelus Novus). Caim e Abel não são as personagens certas aqui [eu conheci Caim, e é uma figura bem diferente]; mas essa ideia de se «fazer matar» para que o outro «fique mal» é terrível. Terrível e adequada? Não sei bem. Será que eu me fiz matar? Há muitos elementos que vão nesse sentido. Quem se aventura em zonas perigosas aceita um risco. Mas eu «fiz-me matar» para que ela ficasse mal perante todo o mundo? Não foi isso, de todo, mas é verdade que a minha reacção diferida tem sido essa. Não quero que ela fique mal perante os outros (as pessoas sabem lá quem «ela» é), mas quero certamente que ela fique mal nesta história, nesta narrativa escrita, onde eu aliás já constava mais do que mal (cobarde, estúpido, ingénuo). O que eu não quero é que desta vez, ao contrário das outras, ela fique com uma imagem totalmente inocente e eu saia daqui o mau da fita, o impulsivo, o louco. Chega dessa conversa. Numa relação que falhou, ficam ambos mal um perante o outro. A parte totalmente falsa da frase (neste caso) é que eu não sou hipócrita, mas selvaticamente sincero; e que ela recupera facilmente, que é para isso mesmo que servem os «grupos» de que se rodeia.

14.11.08

Tonight



So, drink, drink, drink
And be ill tonight

Um módico de consolo

Não sei porque é que dizem mal do título do novo Bond. Quantum of Solace é um belo título. E a que podemos aspirar na vida senão a isso: um módico de consolo?

13.11.08

A cápsula



Tem havido poemas a tudo. No arco temporal e estético que vai de Baudelaire a Ponge, tivemos poéticas da arcada e do sabão e de tudo o mais. O nosso Gedeão até escreveu um poema sobre o fecho éclair. Mas não conheço nenhum elogio da cápsula. E é injusto que não haja nem um. O vulgar comprimido ou a drageia são coisas grosseiras e arcaicas, que se esmagam e têm gosto e se sentem na garganta. Ao invés, a inodora e colorida cápsula é um modo altamente civilizado de medicação, um invólucro gelatinoso que se engole e que depois se dissolve, uma distribuição padronizada de vantagens químicas. Alguém que escreva, por favor, o elogio da cápsula.

12.11.08

E na doença

Os votos de casamento incluem um compromisso que parece estranho: «na saúde e na doença». É estranho na medida em que as pessoas são geralmente mais acarinhadas quando estão doentes do que quando estão saudáveis. É como se os doentes gozassem de uma espécie de moratória. Então porquê essa exigência nupcial? Talvez porque «a doença» é apenas uma das manifestações da fragilidade do outro. O que se pede é que aceitemos a fragilidade do outro, que é igual à nossa. Quem se vai embora perante uma doença não recusa apenas o sacrifício, mas a própria ideia de fragilidade.

11.11.08

Cold turkey

Kim Novak ajudando Frank Sinatra a aguentar cold turkey. Ela, lindíssima e fria, um pouco perigosa, ali com um desvelo incrível, sofrido, uma compaixão empenhada: fechando a porta à chave, escondendo os objectos cortantes, pondo-lhe mantas e cobertores em cima, esfregando-lhe as mãos e os braços gelados, dando-lhe açúcar, e depois caminhando em silêncio ao lado dele.

(The Man with the Golden Arm, 1955, de Otto Preminger)

10.11.08

Perdoar e esquecer

A dois tempos

A atitude dela é um caso de reacção a dois tempos. A reacção imediata foi de certo modo mais racional, porque foi a decisão pela qual ela transmitia uma imagem de si. A reacção diferida foi mais emocional mas também mais fria, porque incluiu um cálculo de vantagens. Ou seja: a reacção imediata foi moral e a reacção diferida foi, digamos, natural.

Hipercorrecção

É verdade que tenho escrito em regime de «hipercorrecção». Os últimos 2 anos deste blogue quase se resumem a isso. Há um esforço maníaco em desfazer tudo o que fiz antes. E uma atracção pelos métodos violentos. Claro que a correcção, quando se torna hipercorrecção, corrige mesmo aquilo que não estava errado. Que importa? Eu preciso é de estar certo agora.

9.11.08

Special K

Vem no Kierkegaard: deves tornar-te uma pessoa odiosa aos olhos dela, pois só assim ambos se libertam: ela de ti e tu dela.

7.11.08

Capitu



[...]

É dessa fraqueza que nasce a suspeita. Uma suspeita que se manifesta na famosa definição de Capitu como oblíqua e dissimulada, por causa dos seus olhos de ressaca: «Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá ideia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e energético, uma força que arrastava para dentro, como uma vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca». Bento vê-se arrastado por essa força, e depois disso é o ciúme (e não o enigma) o protagonista da história. «Quem é Capitu?» é questão que na verdade já não se põe, porque Capitu é apenas um espectro.

(no Público de amanhã)

6.11.08

John Leonard (1939-2008)

Leio em papel ou online uma dezena de revistas e jornais americanos. John Leonard escrevia em todos (The New York Review of Books, The Nation, The New York Times Book Review, New York Magazine, Harper’s, The Los Angeles Times, The Village Voice, Vainty Fair, Esquire, The Atlantic Monthly, The New Republic) e sobre quase tudo. Recordo sobretudo aquelas críticas literárias que parecia terem sido escritas durante meses, de tão detalhadas na análise e cinzeladas na prosa. Agora é que James Wood não tem mesmo concorrência.

It doesn't matter if we all die



A canção começa brutalmente: «não importa se morrermos todos». O verbo é forte, e acentuamos todos o verbo «morrer», e toda a gente fica muito agitada com o verbo morrer, como se fosse o único definitivo, e até se trocam telefonemas humanistas de madrugada. No entanto, é preciso ter penado um pouco para saber que nesta frase o acento tónico está em «não importa». Numa escala de gravidade, «morrer» é o mais grave, o que mais chama a atenção. Mas quando se chega ao estado em que se diz «não importa», toda a gravidade já foi excedida, e morrer deixa de ser o verbo decisivo.

5.11.08

Cowboy



Sam Shepard nasceu a 5 de Novembro de 1943.
Entrou hoje na «terceira idade» (mas ninguém acredita).

Discurso

O seu melhor discurso foi aquele em que reconheceu a derrota.

E já agora gostava de repetir isto:

Change

Obama mereceu ganhar. Geriu durante quase dois anos uma campanha sem falhas, primeiro derrotando o mainstream Democrata representado por Hillary Clinton e depois vencendo por larga margem um dos mais prestigiados (e moderados) políticos Republicanos, John McCain. Foi sempre equilibrado e cool, e fez alguns discursos brilhantes. Em pouco tempo, Obama passou de desconhecido a ícone global. Isso não se deveu apenas à sua oposição frontal à Administração Bush, condição necessária mas não suficiente para uma vitória Democrata. Desta vez, o Partido Democrata não escolheu um candidato insípido como Mondale, Dukakis, Gore ou Kerry, mas um político fulgurantemente carismático, num momento histórico em que existem poucos ou nenhum no mundo. Obama tem um percurso de vida extraordinário. Representa ao mesmo tempo as possibilidades do «american dream» e a libertação de um triste passado de racismo e segregação A componente simbólica desse triunfo é evidente, e um evidente motivo de alegria. Mas Obama conseguiu entrar em todos os eleitorados, não apenas os clássicos Democratas mas por exemplo os hispânicos, e ganhou em vários estados «vermelhos». Mais que isso: o mundo votou nele. A eleição de Obama representa (por agora) uma espécie de «americanismo» como raramente se viu. Trouxe esperança e promessas de mudança. Dele se esperam medidas justas como a eliminação da tortura, outra política energética e de saúde, leis de imigração mais tolerantes num país que nasceu com emigrantes. Em matérias financeiras e fiscais, teremos receitas keynesianas e «sociais» que vão responder a uma crise gravíssima, com resultados incertos, e provavelmente um recuo para o proteccionismo económico. Em matéria de costumes e investigação científica, Obama vai manter uma relação pacífica com o tempo em que vivemos e não alimentar escusadas «guerras culturais». A grande incógnita é mesmo a política externa, que não se faz apenas com carisma e voluntarismo, mas com acções decisivas ou negociações intrincadas. O caderno de encargos de Obama inclui uma retirada faseada e sensata do Iraque e o dossiê do nuclear iraniano, para além de outros conflitos mais antigos e duradouros. Se vai ou não fazer diferença haver um presidente americano chamado «Barack Hussein Obama», é ainda uma incógnita. O argumentário contra Obama insistia (e bem) na sua inexperiência executiva, mas é verdade que os grandes momentos fazem os grandes líderes. Cabe a Obama mostrar o que vale, com um Congresso que o apoia, media que o defendem e uma opinião pública mundial que o idolatra. É um Democrata de quem gosto, mas não consigo ter aquela certeza de que ele vai ser um grande presidente que anima amigos meus à esquerda e à direita. Tenho muito medo do messianismo, que com Obama tem atingido dimensões colossais. Que as óbvias qualidades de Obama como candidato sejam as suas qualidades como Presidente, eis um desejo que todos temos. E ou muito me engano ou pessoas como eu, que não teriam votado em Obama, vão ter de o defender muitas vezes contra aqueles que hoje estão eufóricos com a sua vitória. Com presidentes americanos, é costume. A realidade é uma grande escola.

3.11.08


A coligação

John McCain devia ter ganho em 2000. Já achava isso quando ainda não sabia quem era esse tal George W. Bush, e agora, oito anos depois, temos todos a confirmação de que teria sido uma melhor escolha. Infelizmente, McCain foi derrotado nas primárias republicanas de 2000, em parte com jogo sujo, e agora são ínfimas as hipóteses de suceder a um presidente desastroso. É pena, porque McCain tem experiência, competência, é um homem sério e um espírito independente (e tudo isso é comprovável em décadas de vida pública). É também pena que o velho maverick tivesse que fazer as cedências que fez (ainda que fingidas) à ala menos recomendável do GOP; mas infelizmente, sem a adesão dos «conservadores sociais» e da direita religiosa um Republicano não ganha eleições (como Bush pai bem sabe). Com o fim da carreira política de McCain (e com Giuliani aparentemente queimado), não vejo quem possa fazer uma «coligação» Republicana liderada pelos moderados e não pelos radicais. Talvez uma vitória de David Cameron lhes abra os olhos.

W.

Quando George W. Bush apareceu, desconfiei, mas não demasiado. Era pouco articulado, o que é sempre uma desvantagem. Era filho de um anterior presidente, e não gosto de herdeiros em repúblicas. Tinha cunhado o termo «conservadorismo compassivo», e o conservadorismo é uma sólida tradição intelectual que dispensa adjectivos adocicados. Finalmente, Bush aparecia (lembram-se?) com uma agenda externa isolacionista, velha tentação de alguns Republicanos. Desconfiei, mas devia ter desconfiado mais. Julguei que Bush era um moderado, como o pai, e não me apercebi da entourage. Tinha lido alguns neocons, e embora não aprecie o espírito messiânico, achava que eram uma minoria intelectual.

Depois, aconteceu o 11 de Setembro. Era preciso reagir, e o ataque ao Afeganistão foi acertado. Mas a luta contra o terrorismo descambou. O atentado às Torres e ao Pentágono inaugurou aliás uma série de catástrofes de vária natureza: a invasão do Iraque, justificada com provas falsas e seguida de uma ocupação mal gerida; Guantánamo e o uso infamante da tortura; o furacão Katrina, combatido com medidas atabalhoadas; uma crise financeira que lembra 1929, em parte culpa da falta de tutela adequada.

Não há como negar o fracasso desta presidência, e os danos que causou à América e ao mundo.

Não posso dizer que me enganei acerca de Bush, porque não tinha especiais expectativas, mas enganei-me seriamente acerca da guerra. Um conservador é um céptico. Fomos pouco cépticos e deu no que deu. Que nos sirva de lição.

Unanimismo

No Guardian, vários escritores americanos que admiro (Edmund White, Rick Moody, Edward Albee, Gore Vidal, Tobias Wolff, Joyce Carol Oates, Paul Auster) escrevem sobre Bush. O mais estranho é que em vez de uma dezena e meia de textos temos como que um só texto, com pequenas variações na adjectivação (o democratíssimo Tobias Wolff, por exemplo, lamenta que os americanos sejam estúpidos). E é isso que me incomoda nos «intelectuais»: não as suas opiniões concretas, mas o clima de unanimismo que criam entre eles, mantendo sempre a fantasia de que alimentam uma «cultura adversarial». Não se trata de Bush, muito justamente criticado [já lá vamos], mas da estranha sensação de ver criadores tão diferentes dizerem todos o mesmo quando se trata de política.

Que parte

Que parte de «não tenho nada a perder» é que não percebeste?

Antropologia

Num momento decisivo da minha vida, entreguei-me confiadamente ao «optimismo antropológico». Logo eu, grande arauto do pessimismo. Confirmei então que o pessimismo é que está certo. Não que as pessoas sejam «naturalmente más». São naturalmente pragmáticas e egoístas. Não vejam isto como uma censura: o egoísmo é que é natural. E o contrário do egoísmo é uma palavra que ela me proibiu.

Causas de exclusão da ilicitude

Uma pessoa que tem uma doença é «uma pessoa que tem uma doença». Uma pessoa que tem várias doenças é «um doente». E ninguém é obrigado às doenças alheias.

Dificuldades com a monogamia

Na verdade, não tenho dificuldades com «a monogamia», mas com Monogamia (1997), que julgo ser o primeiro livro de Adam Philips traduzido em português (edição Angelus Novus). Philips é o terapeuta dos intelectuais londrinos e escreve em publicações como a London Review of Books. Gostei de tudo o que li dele, mas tenho um problema com Monogamy, ou antes, três problemas.

Desde logo, não creio que Monogamia seja realmente sobre a monogamia, tema quase tão impossível de estudar como, digamos, a existência do limbo. É mais justo dizer que Monogamia é sobre «as relações» ou «o casal», que são temas um pouco deslizantes.

Depois, embora Philips tenha bastante talento, não tem (acho eu) grande talento aforístico, e este livro é constituído por aforismos e paradoxos, às vezes bastante gratuitos, sobretudo quando se trata apenas de criar efeitos invertendo os termos das afirmações

Finalmente, embora Philips não seja de todo um Alberoni (deus nos acuda) também não é um Barthes, e a sombra imensa dos Fragmentos de um Discurso Amoroso obscurece Monogamy.

Isso não impede alguns aperçus (como se diz em inglês) interessantes, como quando ele explica que as terceiras pessoas são o garante (e não o perigo) da monogamia. E também gosto do conservadorismo com que Philips defende que quem escolhe a monogamia, rejeita acima de tudo as alternativas de vida: a «impessoalidade» (a promiscuidade) e o «isolamento».

E no entanto tudo isto me parece terrivelmente sisudo, embora tenha graça, quando eu preferia que fosse solene mas leve. Monogamia é a introdução portuguesa a Adam Philips: que venham agora On Kissing, Tickling, and Being Bored (1993) e On Flirtation (1995).

2.11.08

Saídas de emergência

A «compreensão» é um conceito admirável. Quando alguém diz que «compreende», é porque já estuda discretamente as saídas de emergência.

O juiz decide

O recurso é improcedente. Um miúdo de 14 anos não tem direito de voto; um anão não joga na NBA; ninguém exerce medicina com o curso dos liceus; e quem vive com o salário mínimo não se hospeda no Ritz. O juiz decide que ela tinha razão.

A crise

I paid the full lip service to the repercussion
Which is to say I weighed the risk reward

But who can budget for a fallout of these proportions?
Take your shot
That’s what you pay me for

(...)



I didn’t see it at the time as a conflict of interests
A pretty girl at the wheel of a German car
It isn’t hard to surrender to market forces
Take your seat
Become the passenger

(Lloyd Cole, «How Wrong Can You Be?» (ha), do álbum Antidepressant (ha), 2006)

Dias de chuva

Um leitor vem ter comigo e sugere que eu não escreva «como se estivesse a morrer». Mas essa é uma ficção impossível: estou e estamos de facto «a morrer», mais perto disso hoje do que ontem, e mais ainda amanhã. Coisa diferente é esta «morte na alma» que às vezes é mais aguda, como uma ferida quase esquecida mas que lateja em dias de chuva.

Os mortos de Hollywood

No fundo, faço aqui o papel daqueles inverosímeis mortos de Hollywood que, baleados, ainda debitam umas frases poéticas.

A janela indiscreta

Encontrámo-nos numa exibição estival da Janela Indiscreta, dois «casais» de quase adultos, e nessa noite ele mandou-me uma mensagem escrita em que dizia que eu estava com um aspecto «plácido». Nunca me tinha ocorrido esse termo, mas era bem escolhido: uma tranquilidade feliz e, digamos assim, completa, sentados eu e ela em cadeiras cá atrás a comentar baixinho a perversa geometria de Hitchcock. É óbvio que a placidez não durou muito, que não durou mesmo nada, e depois pensei como era curioso ter ido com ela ver exactamente aquele filme naquela esplanada, eu um entrevado como James Stewart e ela uma coquette como Grace Kelly. Com a desvantagem de eu não ter tido atenção e coragem, ao contrário de Jimmy, e de ela não ter tido paciência e ternura, ao contrário de Grace. Mas a vida, já se sabe, não é cinema.

Tottenham

RAY: What's that place in between? Is it purgatory? That's where you go when you are somewhere in-between, not really good but not really shite either?

KEN: Yes.

RAY: Like Tottenham?

(Colin Farrell e Brendan Gleeson em In Bruges, escrito e realizado por Martin McDonagh, 0 filme com os melhores diálogos de 2008)